Por Júnia Schultz*

Os microrganismos são incrivelmente adaptados e conseguem habitar todos os ambientes da Terra. Bactérias termofílicas, por exemplo, gostam do calor e precisam de estar sob temperaturas superiores à 50ºC para um bom desenvolvimento. No entanto, essas bactérias sobrevivem na Antártica, um dos ambientes mais severos do planeta, conhecido por ser um ambiente gelado e inóspito ao homem.

 Você deve estar se perguntando: como podem existir microrganismos que necessitam de altas temperaturas na Antártica? Há fogo e calor em meio à neve?

Sim, em locais específicos que sofrem a influência da atividade vulcânica e, assim, proporcionam condições ideais para o crescimento destes microrganismos. A Ilha Deception é um exemplo. Esta ilha é a cratera de um vulcão bastante ativo, localizado na Antártica e apresenta emissões fumarólicas (vapor e gases) com temperaturas que variam de 90 a 110ºC, águas termais e solos quentes com temperaturas entre 40 e 100ºC.

Há relatos na literatura que indicam que esses ambientes quentes na Antártica são muito diversos, apresentando espécies variadas de microrganismos, como os pertencentes aos gêneros Geobacillus, Bacillus e Thermus. Obviamente, os microrganismos adaptados a esses locais são diferentes daqueles adaptados às regiões frias. As condições climáticas distintas em uma micro-escala são muito importantes para a seleção e manutenção de uma biodiversidade elevada.

O mais interessante de tudo isso é o potencial biotecnológico que bactérias desses ambientes possuem. Por estarem adaptadas a condições extremas, podem diferir metabolicamente dos microrganismos de outras regiões, e, portanto, são excelentes alvos para a procura de substâncias importantes para a indústria química, alimentícia e farmacêutica, ou seja, podem fornecer produtos e prestar serviços para você!

Com base nesse conhecimento, pesquisadores do Chile foram à Antártica buscar lipases, que são enzimas amplamente utilizadas na indústria de alimentos. A produção industrial normalmente envolve altas temperaturas, que destroem as enzimas encontradas em ambientes comuns. Na antártica os pesquisadores encontraram uma bactéria do gênero Geobacillus produtora de lipases resistente à altas temperaturas, e atualmente estudam a otimização da atividade dessa enzima, pelas mudanças nas condições de reações.

O universo microbiano é mesmo fascinante, e mesmo nos ambientes mais extremos podemos encontrar microrganismos capazes de melhorar a vida do homem.

Texto revisado e editado por: Caio Rachid e Thais Barbosa.

*Júnia Schultz é bióloga e doutoranda do Programa de Pós-graduação em Biotecnologia Vegetal e Bioprocessos pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Desenvolve pesquisa com bactérias termofílicas da Antártica e biorremediação de ambientes extremos.

Imagens: 1. Arquivo pessoal de Amanda Bendia (2015) e 2. Yuri Pinheiro (2016).

MUÑOZ, P.; CORREA-LLANTÉN, D.; BLAMEY, J. Ionic Liquids Increase the Catalytic Efficiency of a Lipase (Lip1) From an Antarctic Thermophilic Bacterium. Lipids, v. 50, p. 49-55, 2015.

Microrganismos antárticos: entre o fogo e o gelo
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