Por Laís Feitosa Machado*
O Aedes aegypti é o mosquito transmissor do zika vírus. Este inseto, facilmente encontrado em zonas urbanas, pode produzir até cinco ninhadas de 200 ovos ao longo de sua vida. Para o bom desenvolvimento dos ovos, as fêmeas necessitam de uma proteína que encontram, preferencialmente, no sangue humano. Para acessar essa proteína utilizam uma estratégia curiosa: em vez de sugarem todo o sangue necessário de uma só vez, as fêmeas desferem múltiplas picadas em diferentes pessoas, e sugam apenas pequenas quantidades em cada uma delas. Isso faz com que o número de pessoas que um único mosquito que contenha o zika vírus pode infectar seja bem grande.
Na ausência de vacinas, as poucas opções atuais de controle da zika se limitam à redução das populações do mosquito transmissor. No entanto, as estratégias conhecidas, tais como a utilização de inseticidas e o controle das larvas, não têm sido eficazes. Há, portanto, uma necessidade urgente de abordagens mais eficientes para o controle do vetor. Uma bactéria que vive no interior do Aedes aegypti tem sido apontada como um novo caminho de combate à doença.
Bactérias do gênero Wolbachia são naturalmente encontradas em associação com alguns grupos de insetos e, atualmente, são utilizadas ao redor do mundo como parte de novas estratégias para o controle da transmissão de alguns micro-organismos, como os vírus da dengue e da malária. Uma vez no corpo dos mosquitos, essas bactérias podem bloquear a transmissão destes vírus.
Sabendo disso, pesquisadores da Fiocruz testaram a habilidade de bactérias Wolbachia de minimizar a infecção e a transmissão do zika vírus pelo Aedes aegypti. No experimento, os cientistas utilizaram mosquitos com e sem bactérias Wolbachia em seus organismos e os infectaram com dois tipos de zika vírus. Após 14 dias da infecção, coletaram saliva de todos os mosquitos e injetaram em dois grupos de mosquitos sadios, um que abrigava Wolbachia e outro que não abrigava. O resultado foi que, após 14 dias da infecção, vetores contendo bactérias Wolbachia apresentaram redução de até 90% dos vírus em sua cabeça/tórax, de até 68% em seus abdomens e de 55% em sua saliva.
Para testar se os vírus encontrados nos mosquitos com e sem a bactéria podiam vir a desencadear a zika, os pesquisadores injetaram saliva dos dois tipos de mosquitos em um terceiro grupo de Aedes aegypti que não continha essas bactérias em seu organismo. E o que observaram foi que a infecção não foi detectada quando a saliva foi proveniente dos que continham Wolbachia.
Embora ainda não se saiba o que acontece no organismo do inseto que contém a bactéria quando ele é infectado pelo zika vírus, observa-se que a bactéria consegue reduzir a multiplicação desse vírus. Assim, os resultados encontrados indicam que a utilização de Aedes aegypti contaminados com bactérias Wolbachia pode ser uma opção eficaz para o combate da zika no Brasil. Essa é uma estratégia que já vem sendo utilizada em países nos quais houve o surto da doença, como Austrália e Indonésia, e, recentemente, tem sido recomendada pela Organização Mundial de Saúde como uma ferramenta de baixo custo de controle da transmissão da zika. No entanto, para a liberação segura de mosquitos contendo essas bactérias no ambiente, é importante a realização prévia de estudos ecológicos e epidemiológicos, buscando compreender as consequências dessa liberação para os ecossistemas.
*Professora Adjunta da Universidade Federal do Vale do São Francisco – UNIVASF.
Texto revisado e editado por Caio Rachid